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Mensagem de Francisco Moita Flores (antigo Presidente da Câmara Municipal de Santarém)

Está a caminho do centenário o caminho já andado pelo Grupo de Forcados Amadores de Santarém.

É já muito caminho andado. Quase um século de grandezas e misérias, de glória e tragédia, sempre como actor principal da grande Festa Brava.

São muitas vidas, são muitos forcados, muitas pegas, muitas corridas, um rasto de muitos anos afirmando Santarém, o prestígio da cidade, a importância cultural desta forma bem portuguesa de olhar o toiro e chamá-lo. Dizem os entendidos que os chamam para a reunião e pega, digo eu que citam a fera para o abraçar. Um abraço simbólico, é certo. Mas o momento maior do psicodrama taurino. Olhar o toiro nos olhos e neles ver a morte. Pois que é um abraço de vida e morte e, também, de vida ou de morte.

O Grupo de Forcados Amadores de Santarém já tem uma história. E para além dessa narrativa, são parte da história de Santarém. Contribuíram para a dignificação da nossa cidade, afirmaram no país e fora dele a marca Santarém, terra de homens livres, valentes, hospitaleiros. Foram, e continuam a ser, uma das referências mais prestigiadas do Ribatejo e com eles, e por eles, projectou-se no país uma cultura específica que se inscreve na identidade histórica e cultural da região. É um orgulho vê-los na arena. O desafio, a garra, o desprendimento, a coragem no olhar, no coração e no peito. Um orgulho e um agradecimento em nome do povo de Santarém.

Deixem-me, ainda, dar-vos o meu testemunho pessoal. A primeira vez que vi o Grupo Forcados Amadores de Santarém em acção foi no Campo Pequeno. Teria os meus quinze anos. O seu cabo era um sábio. Chamava-se Rhodes Sérgio. Havia outro grupo. Julgo que de Montemor. E, aficionado da Festa, foi com um fascínio inaudito que vi a alternância de pegas dos dois grupos. Fiquei com o meu pai na barreira junto á qual se encostava o Grupo de Santarém. Escutava com atenção as indicações de Rhodes Sérgio e custava-me a acreditar no que ele dizia. Depois do primeiro ferro ele conhecia o touro. Fazia o prognóstico da investida, da força, do derrote, da forma de abordar a fera. Parecia mágico. E depois na arena, terminada a lide do cavalo, o toiro comportava-se como ele o tinha enunciado. Percebi nesse dia, ou melhor nessa noite, que aquele diálogo era conversa antiga. Que era uma memória profunda de relação com os animais, de prazer pelo risco, de desafio e de estima. O toiro era a morte mas também era amigo. Era o desafio mas também era o sentido da existência do forcado. Eram diálogos com uma cultura ancestral produzida nos campos de pastagem, nas arenas da bravura, nos séculos de relação afectiva entre animais e homens. Que aquele psicodrama era um combate entre adversários que superavam as suas forças para além do limite da vida. Não era apenas uma pega. Era, sobretudo, um sinal da História, da nossa História saída do ventre fecundo da nossa Terra Mãe. E nessa noite decidi que haveria de ser forcado.

Agora, que o olhar se tornou mais pardo, que a vertigem começa a dar lugar a maior quietude, não deixo de continuar a entrar numa praça de toiros e cada vez que salta o Grupo de Forcados de Amadores de Santarém vem à memória essa noite já longínqua e que me ensinou o segredo da verdadeira dimensão existencial da Vida. E da Morte. E dessa necessidade profunda de nos encontrarmos com o Outro. Com os nossos irmãos de todos os matizes, panteístas, vindos da divindade suprema do Sagrado, tal como nos ensinou S. Francisco.

Um abraço de Parabéns ao Grupo de Forcados Amadores de Santarém!

Que a Vida lhes sorria sempre como um salto sobre a sublimidade da Morte. Santarém agradece reconhecida. O povo de Portugal tem-vos no coração.

Bem hajam!

Francisco Moita Flores

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