Recebi por intermédio do Peu Torres o “desafio” para fazer a crónica da corrida Real em Évora. Aceitei claro, com muito gosto, mas com muita responsabilidade também, pois para opinar não tenho grande desembaraço... De qualquer forma aqui deixo o meu testemunho do que tive o privilégio de assistir nesta noite na Arena de Évora. Gostava de começar por agradecer o amabilíssimo convite que o Diogo me fez para estar ali bem pertinho do Grupo e poder reviver todas aquelas emoções que nos marcam p'rá vida. O Grupo fardou-se no Monte da Galvoeira, propriedade da minha querida “mana velha” e do meu cunhado Pedro Cabral. Para não variar, o Grupo foi tratado que nem “Lords”, banhinho na piscina, lanchinho, sopinha, docinhos, etc... os mimos todos! A forma como a minha irmã Guida nos recebe em sua casa demonstra bem o carinho que ela tem pelo Grupo de Santarém, e não é só de agora, já vem desde as primeiras vezes que pegamos em S. Manços, em que ela nos preparava aqueles famosos ovos mexidos com espargos no Monte do Cume... Tenho a certeza que o continua a fazer porque o Grupo sempre a tratou com enorme respeito e admiração. Verdade seja dita, o Grupo é recebido em todo lado onde vai, de forma espectacular e isso é um privilégio de que nos podemos orgulhar. Bem hajas, mana! A corrida Real foi muito agradável, decorreu a um bom ritmo, apesar das interrupções a que uma transmissão em directo obriga, facto que pode também ter levado a que muitos habituais espectadores tenham ficado comodamente em casa a assistir à corrida transmitida pela RTP e, conjuntamente com os elevados preços dos bilhetes, a meia casa que esteve na Arena de Évora saiu, pode dizer-se, bastante satisfeita com o que viu. Um curro de toiros Passanha bem apresentados que saiu de forma geral cómodo, à excepção do 4º toiro que dificultou e de que maneira a tarefa ao desinspirado João Moura Caetano bem como ao Grupo de Évora, mas contribuindo não só para as boas lides dos cavaleiros João Moura Jr. E João Ribeiro Telles Jr., como também à excelente noite de pegas. Para abrir praça o Diogo escolheu o António Jesus, que após brindar a D. Duarte de Bragança, perfilou-se perante o Passanha de 600Kgs, dando de forma segura enorme vantagem, evidenciando experiência e maturidade. Com um cite bonito, mandou e percebendo os terrenos, carregou com uma corrida, aguentou, recuou e reuniu correctamente. Consequentemente a viagem foi fácil, com o Grupo a ajudar de forma muito sólida. Tudo parece fácil quando as coisas são bem feitas, mas na verdade um Passanha de 600Kgs não tem nada de fácil! Para o 3º da noite com 520Kgs foi o João Torres. Bonito brinde ao seu primo Nuno. O toiro revelou pouca força mas bastante disponibilidade, tendo o João iniciado o cite a meia praça com muita calma, deixando-se ver para então poder iniciar o cite. O toiro assim que o viu mostrou-lhe que não era preciso “insistir” muito para se arrancar, e o João manteve-se calmo. Surgiu no entanto um imprevisto e o sentido do toiro levou-o a distrair-se com algo atrás, e logo que se virou vendo o João a cortar terreno, arrancou de pronto. Por vezes perante imprevistos como este, fica-se sem saber o que fazer, mas o João revelou muita maturidade e sem se descompôr, aguentou, recuou e apesar de um estranho no momento da reunião, fechou-se à córnea com uma rapidez e decisão incríveis, suportando dois derrotes fortes, tendo a pega concretizado-se com o Grupo mais uma vez a ajudar de forma extraordinariamente sólida. O 5º da noite, com 590kgs, foi para a cernelha através do Ricardo Tavares e do David Romão que brindaram ao público. O toiro estava inteiro e não se mostrou muito interessado nos cabrestos nem vice-versa, e como o público não gosta de percas de tempo, o Ricardo aproveitou a sábia ajuda do Carlos Grave que na trincheira distraiu o toiro, e sem cabrestos, entrou que nem um tiro, tendo o toiro retribuído com dois “balásios” despachando o Ricardo pelo ar e o David contra a trincheira deixando-o um pouco amassado... Não tinham passado 30 segundos e já estavam novamente trancados no toiro, entrando novamente a descoberto, vindo a concretizar um bonita pega. Muita decisão e muita eficácia! Não tenho dúvidas que gosto muito mais de ver a parelha entrar com o toiro bem encabrestado, mas também sei bem a quantidade de vezes em que se estiveram 8 ou 10 minutos à espera dessa oportunidade e ou porque não se aproveitou ou porque nem se quer surgiu, as coisas complicaram-se e muito. O Grupo de Santarém alternou com o Grupo de Évora, que teve uma noite marcante, indo para o seu 1º o João Pedro Oliveira, que eu nunca tinha visto pegar, e que me surpreendeu de forma muito positiva pois efectuou uma pega muito correcta, dando vantagens, mandando e mostrando uma forma de estar em praça que me agradou muito. Para o 4º toiro veio o momento alto da corrida, com o António Alfacinha a fazer uma 1ª tentativa que se se tivesse concretizado seria das pegas mais portentosas que ví na vida. O toiro era complicadíssimo e tinha sido muito mal lidado, chegando à pega cheio de sentido e a saber bater, depois de ter dado um enxerto de porrada nos cavalos do João Moura Caetano e desfeito os capotes dos bregas. Mas isso para o António Alfacinha eram “rebuçados”, tal não era a determinação com que ia. Na 1ª tentativa teve imponente e fez tudo bem feito, as vantagens, as distâncias, mandou e provocou uma investida que mais parecia um TGV. Também isso para ele são favas contadas...!! (à excepção da piscina! Mas isso foi outra tourada...) Pena não se ter concretizado. Nas restantes 4 tentativas esteve estóico mas a falta de sorte e discernimento não o ajudaram e lá se concretizou a pega com ele capaz de lá ir mais uma mão cheia de vezes, se assim fosse preciso! A fechar a corrida o Gonçalo Mira e o Manuel Rovisco saíram para a volta efectuando uma pega muito bonita e vistosa a um toiro grande, que na primeira vez que encabrestou, aproveitaram de imediato e apesar de não conseguirem fechar-se, não desistiram e quando o toiro começou a querer fugir remediaram e lá se tracaram, tendo este tentado tirá-los tanto procurando como fugindo, mas muito bem a dupla bem colocada concretizaram a pega com muita emoção. Gostava agora de aproveitar esta ocasião para prestar a minha homenagem a dois forcados. Miguel Navalhinhas e Pedro Cabral. Desde que me lembro do Grupo de Santarém, há mais de 25 anos (bolas tou a ficar velho...) muitos foram os ajudas que vi, muitos dos quais com quem tive o privilégio de pegar. Tantas vezes fiquei impressionado com a forma como ajudavam, a técnica, a coragem, a disponibilidade, a entrega, os êxitos, as voltas que deveriam ter dado e não deram, as colhidas. Mas como a grande maioria dos forcados, pegar ou ajudar a um nível superior, não se consegue durante muito tempo. O Miguel e o Pedro fazem-no de forma superior há 12 épocas! Ajudar da forma como eles sempre ajudam não está ao alcance de qualquer um e fazê-lo durante tantos anos e com a regularidade com que o fazem é simplesmente incrível. Não tenho dúvidas em afirmar que são dos melhores ajudas que tive o privilégio de alguma vez ver. Parabéns! Mas como a noite ainda era uma criança, após a corrida o Grupo regressou ao Monte da Galvoeira para se desfardarem e claro, regressaram os mimos... e como a malta após o labor estava cheia de fomeca, aproveitou para jantar pela 2ª vez. Entretanto dirigi-me ao esbarrondadouro onde iria ser o jantar (o 3º), com a Sandra e a Bindes e, ao fim de um tempo, o Carlos Grave e a Tejuca, lá aguardamos o fim do 2º jantar para que a malta viesse rematar a noite com o derradeiro jantar! Passou-se um óptimo bocado e gostava apenas de salientar o marcante discurso do Carlos Grave, em que pediu ou recomendou à rapaziada uma coisa que sempre subscreví. Que em frente aos toiros fossem sempre eles próprios, pegassem com sentimento e deixassem o seu carácter e a sua personalidade comandar, caracterizando-os e diferenciando-os. Se há coisa que me desagrada é não conseguir distinguir dois forcados porque se limitam a pegar “by the book”, o que até pode ser eficaz mas não tem nada de pessoal e muito menos expressa o sentimento que cada um tem verdadeiramente quando estão em frente a um toiro. Para mim a noite ficou por alí mas no dia a seguir, por volta do meio dia, ainda não tinham chegado os sete ou oito que iam dormir à da minha irmã, por isso imagina-se que a “festa real” também não foi suficiente para saciar a sede da rapaziada... Resta-me então agradecer a vossa companhia, a óptima noite que me proporcionaram bem como a extraordinária actuação que tiveram na Arena de Évora. Grande abraço a todos! Manuel Murteira |